quinta-feira, agosto 09, 2007

Vai estragar a simpatia!

Estávamos sentados ali, falando sobre tudo. Tudo mesmo! E falar de tudo me fez cometer um erro grave. Infeliz, talvez.
Todos vimos um vendedor ambulante passando a uns 15 metros à nossa frente. Como quem pensa, mas não mede conseqüências, falei com os dois (a moça do lado da Tathy até pode ter ouvido, mas não falei pra ela): "O meu sonho é equilibrar um fardo de garrafinhas de água na minha cabeça, como aquele senhor tá fazendo. Olha a desenvoltura que ele tem pra andar!".
Era um comentário sem maldade. Porque eu tenho mesmo esse sonho. Claro que não é um sonho que me tire o sono, que me faça sofrer e buscar a sua realização diariamente, até porque ele é praticamente irrealizável, porque eu derrubo garrafas d'água só em olhá-las.
É, e foi um comentário sem maldade até eu ouvir da boca do Marcelo: "Ow! Ô Água! Ei! Homem da água! Você! Vem cá, por favor!".
O cara não entendeu nada, mas como o chamado daquele rapaz (que era o Marcelo) poderia lhe render a venda de uma garrafinha d'água (quente, porque ele tava caminhando pelo sol), ele veio em nossa direção. Tampouco nós entendemos.
Eu sussurrei pro Marcelo: "Você tá de sacanagem. Você só pode estar de sacanagem. Não tô acreditando nisso". E ele: "Não, ué! Você é minha amiga e a minha obrigação como bom amigo é fazer o seu sonho se realizar". Cara! Eu não acreditei!!!!!!

Em exatos seis segundos o vendedor de água postou-se à nossa frente, e descansou o fardo de garrafinhas d'água no chão. Provavelmente o chamado do Marcelo foi pra ele um alívio... seriam segundos para um descanso. Ele foi o primeiro quem falou.
- Olha, rapá, se quer água, eu posso trazer pra você em alguns minutos. Essas garrafas aqui eu só fui ali buscar pra colocar pra gelar. Tenho certeza de que nem vai querer uma dessas. Tão quentes pra cacete!
- Não, meu querido (o Marcelo tinha que ser amável até na hora de me sacanear???). É que essa minha amiga aqui é jornalista, sabe, e quando ela avistou o senhor vindo lá de longe ela me pediu que o abordasse para lhe pedir um favor.
Os olhos do homem se iluminaram: "Mas é claro! Em que posso ser útil? Quem quer água gelada é a senhora?". Mal sabia ele que se o favor ao qual o Marcelo estava se referindo fosse mesmo que eu quisesse água, poderia ser atendido ali... eu só tomo água quente mesmo!
É, mas eu nem precisei responder ao homem. O Marcelo o fez.
- Não. O senhor sabe o que é? É que o maior sonho da minha amiga é carregar um fardo de garrafinhas na cabeça, como o senhor estava fazendo.
Como fosse possível, os olhos do vendedor se iluminaram ainda mais. Provavelmente era o sol, até por nem ter motivos pra isso. Ele me olhou, olhou pro Marcelo e tornou a me olhar com os olhos dizendo algo do tipo "é cada doido que me aparece...eu devia mesmo era voltar pra Santarém e ser feliz lá. Nesse Rio só tem maluco!". E eu nem posso afirmar que foi isso o que ele pensou mesmo. Primeiro porque ainda não inventaram forma de ler o pensamento dos outros e segundo porque eu nem tenho certeza se o homem veio da Bahia.
- É só isso o que a senhora quer? Então tenha o seu sonho realizado.
Eu: - Não, senhor. Ele está só brincando. É que a gente....
Mas fui interrompida pelo movimento brusco do homem se abaixando e pegando o fardo de garrafinhas d'água. Eu não conseguia acreditar que o Marcelo tinha me aprontado essa...
O homem veio em minha direção, com o pacote na altura do colo pronto para pousá-lo sobre a minha cabeça. Foi aí que eu tive uma súbita idéia que já salvou uma amiga minha e que desde então eu aprendi.
Usei um tom de voz acima, pra mostrar que tava falando sério, embora não houvesse seriedade nenhuma no que eu ia dizer:
- Não ponha sobre a minha cabeça! Vai estragar a simpatia!
Ao ouvir isso, o homem parou como uma estátua. Ai, funcionou! Eu pensei. Ele afastou os braços para o lado para que pudesse olhar meu rosto e perguntou:
- Ah, era uma simpatia? Quer dizer que eu a ajudei numa simpatia? Eu acredito muito nisso, sabe?
- Puxa, que ótimo então. O senhor não coloca o fardo de água sobre a minha cabeça, não estraga a simpatia e a gente fica amigo. Pode ser?
- Mas é claro!
Trocamos apertos de mão e o homem se despediu, feliz da vida, por ter me ajudado numa simpatia.
Sabe que até hoje o Marcelo me deve essa? Preciso, inclusive, pensar num modo de fazê-lo pagar!

Um comentário:

Thais Torres disse...

Tem texto novo lá no Sorrisos. Leia: http://sorrisosplasticosvblog.blogspot.com/
Bjs ; )