Ministério das Perguntas Cretinas

Eu era criança. Não sei ao certo com qual idade, mas criança. Como todas as outras... ou talvez como quase todas as outras... ou ainda, como muitas outras. Ta bom, como algumas outras. NÃO! Como nenhuma outra não! Isso seria calúnia e difamação...
Ta, mas seja como queira. Eu era criança. Quase todos os finais de semana eram em casa de vovoginha. Os seis netos reunidos, fazendo bagunça, arrancando gritos dos adultos e "boa noite, Flávia" - com variações apenas para os nomes - da tia mais preta da família. No domingo, a partir das 16 horas, a casa ficava parecida: mamãe nos arrumando pra irmos pra igreja, o Niltinho invariavelmente assistindo a um jogo de futebol pela TV, a Birinha pintando as unhas e todos gritando com os seis.
Num destes domingos, pouco antes de sairmos pra igreja, a Neguinha - a mesma dos boa noite -tava colocando a gaiola do Podre - sim, o passarinho era Podre por iniciativa da Bia - na cozinha. Eu tava atrás dela, acompanhando os passos. Ela disse: "Flavinha, quando a gente sair, a luz da cozinha precisa ficar acesa pro Podre não ficar no escuro". "Urrum", com certeza eu respondi (porque não me lembro). Ela postou a gaiola em algum lugar que também não me lembro e nos encaminhamos para a sala. Ela à frente e eu alguns segundos atrás. Quando cheguei ao interruptor, perguntei: "Posso apagar a luz?". Pronto. Bastou para a Neguinha criar o MPC. Sim, o Ministério das Perguntas Cretinas e todo mundo me zoar pra sempre (sim, até hoje alguém faz uma piadinha com o assunto). Eu até que tentei explicar que a Neguinha tinha falado que a luz teria que ficar acesa quando nós saíssemos de casa - pelo menos era isso o que eu tinha entendido - mas ninguém nunca mais me deu moral, então....
A partir daí, todos os questionamentos cretinos a gente mandava verbalmente para o MPC. Eu, com a minha imaginaçãozinha de Fantástico Mundo de Bob - que o Marcelo me perdoe o plágio - até criei uma repartição onde funcionaria o Ministério, com estatuto, manual do participante e tudo o mais que seja necessário para a criação de algo do gênero. Se é que isso seja mesmo preciso.
Cheguei até a incluir alguns questionamentos imbecis do Niltinho ao "meu" MPC, como no dia em que vovoginha disse a ele, com lágrimas nos olhos: "Filho, acabaram de enterrar o irmão Vicente", ao que ele respondeu com o seguinte questionamento: "Ué! Ele morreu?". Vovoginha nem teve tempo de pensar no que dizer, se é que ia dizer alguma coisa! A Neguinha irrompeu a sala tomando-lhe a vez: "Não. Ele foi enterrado vivo. Acredita?". Eu ADOREI a deixa e elegi esta como sendo a principal inclusão feita por mim ao MPC. Outras vieram, mas nada como o enterro do irmão Vivi...
Juro que eu nunca cheguei a pensar em reunir todas as perguntas cretinas (que de acordo com a minha mamãeginha merecem sempre respostas imbecis) num livro. Sério que não. E que bom que não... assim, deixei - mesmo que involuntariamente - o assunto para quem entende: Millôr Fernandes. Tudo bem que eu nem sabia que ele tinha aproveitado tanto a chance... mas percebi isso ontem, zanzando lá pela Veredas.

Ministério das Perguntas Cretinas é um título da coleção Sigmund, lançada pela editora Desiderata e traz, além das perguntas reunidas por Millôr, ilustrações do Jaguar... ou seja, não há o que temer: é gargalhada na certa!
O livro faz excelentes brincadeiras com o duplo sentido das palavras, numa das maneiras mais tradicionais de se fazer humor. Nele, trocadilhos viram arte. Arte de fazer rir.
Desmontando ditados, contradizendo adjetivos, quebrando advérbios, as perguntas demonstram significados que podem estar escondidos em uma só palavra.
A parte boa - aliás, espetacular - é que quem ta lendo ri e pensa em algo do tio: "cara... tem gente que não tem absolutamente nada o que fazer" ou "não acredito que to lendo isso".
Eu não sou muito fã de literatura de humor - nem de nada que tente fazer as pessoas rirem. Segundo a Andressa, não gosto de concorrência - mas Ministério das Perguntas Cretinas vale a pena.
Eu devorei o exemplar em uma tarde e, se você gosta de humor e a este gosto reúne a simpatia por Millôr e Jaguar, o "MPC", que não é o meu, é aquisição necessária para a sua estante.
Baseada nele, vou postando os questionamentos aqui no blog, numa série de posts chamada "Perguntas Cretinas"...
E quem souber responder, que atire a primeira pedra!

Pra quem não conhece, um adianto:

* Se todo queijo tem buraco, por que nem todo buraco tem queijo?

* A barriga da perna tem umbigo?

* Na ilha do Pago Pago as contas são cobradas duas vezes?

* Deve-se ter vergonha do que se vê a olho nu?

E por aí vai...