Mostrando postagens com marcador Segredos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Segredos. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, outubro 14, 2015

Eu queria mais...

É, eu sei que pode parecer egoísmo a frase. E talvez seja mesmo, afinal de contas, "querer mais", quando se está vivendo um dos momentos mais especiais da vida, deve ser mesmo uma pontada de egoísmo. Muito mais pra quem está de fora, sem viver todas essas novidades que estão acontecendo na minha vida.
Se é ou não, definitivamente esta não é a função desta postagem.
O fato é que eu queria uma coisinha a mais. Quando se trata de gravidez, todo mundo quer saúde, mais saúde, família unida, condições pra colocar tudo no lugar, paz pro novo integrante do clã, fotos e vídeos, conselhos e mais uma pá de coisas.
E eu quero, sim isso tudo. Mas queria algo mais. Uma coisinha.
Queria que outra pessoa ficasse feliz neste tempo. Sim, a família e os amigos estão comigo, vivendo cada momento e compartilhando as sensações e as novidades, mas há um vazio. Um espaço, que ninguém pode ocupar.
Porque tudo seria diferente se a Mônica estivesse por aqui. Ela era tão apaixonada por tudo que envolve gravidez e maternidade, que conduziria tudo de outra forma. Eu teria mera participação, por exemplo, na escolha da decoração do quarto. Tenho certeza de que seria por vontade própria que eu deixaria tudo por conta dela por confiar nos gostos e nos talentos que ela tinha e, principalmente, por querer vê-la feliz. E vê-la feliz, pelo fato de que o maior sonho da vida dela, o maior de todos, não foi realizado: o de ser mãe. E ela disse isso nos meses em que passou hospitalizada. Até fazia planos, mesmo sabendo da gravidade da doença e tendo consciência de que, possivelmente ser mãe não estava entre os planos de Deus para a vida dela.
A única pessoa com a qual eu convivi, que nutria este sonho profundo. Ela era assim. Nunca tive por perto uma pessoa que almejasse tanto a maternidade. Sim, ouvi de muita garota que "o maior sonho" era ser mãe, ou que "queria se casar para ser mãe" e mais um monte de coisas. Só que ter dentro de si o sonho, real, era coisa dela. Eu sempre disse que, se Deus colocou no mundo, pessoas com talento para a maternidade, a Mônica foi uma. Ela nasceu pra isso. E mostrava sempre que tinha uma criança por perto. Foi assim com o Netinho e o Júnior, filhos da querida e também saudosa Mirian, com o Leo e a Leslie, filhos da Irinéia, com o Lucas e o Leonardo, da Janaína, com a Thaisa, filha da Dê, com a Raquel da outra Janaína, com a outra Raquel, cunhadinha-emprestada dela, com as duas sobrinhas, Rebeca e Daniela, com as menininhas da grande amiga dela, Maria Paula. E com mais um montão de crianças que nasceram perto de nós ao longo dos anos. Crianças que hoje já são pais e mães, donas de casa e profissionais responsáveis.
Ela era assim. Tinha um amor profundo, uma vontade de estar perto, que pouca gente consegue imaginar. E com toda a certeza, se estivesse aqui, seria assim também com a Aurora. Eu já estaria, neste momento de 20 semanas, com a decoração do quarto definida e possivelmente pronta, as peças do enxoval bordadas, sapatinhos, casaquinhos e toucas tricotados, mantas devidamente personalizadas. Porque ela era assim. Carinhosa com todo mundo, mas com crianças era demais. Ela se entregava. Fazia planos. Vivia, participava, concretizava, criava. Fazia enfeites para os quartos, bordava nomes nas camisetas, pregava botões, recuperava peças dadas pelas mães como perdidas, costurava, customizava. De uma hora pra outra, uma camisetinha branca lisa, virava um lindo vestido, com corações rosas de renda e uma saia rodada que a Mônica criava. Um body azul claro virava tela pra uma super pintura. Aquele espelho retangular, sem borda, virava um espelho de filme, com laços incríveis. E os cabelos das meninas? Lisos, encaracolados ou pixaim. Ela nunca se importou, tinha talento pra todos. Todos mesmo. Em poucos minutos, estavam tão bem penteados que dava vontade de saber fazer igual.
Os alunos da pré-escola que o digam. Todas as ornamentações da sala de aula eram criadas por ela. Personagens do Sítio do Pica Pau Amarelo, em tamanho real, eram fascinantes e surpreendiam a todos. Histórias bíblicas, contos de fadas. Ela criava qualquer coisa, qualquer cara, com qualquer papel, desde que fossem coloridos. E que dessem trabalho. Parece até que essa era sua principal exigência.
Lembro-me de um dia, em que estava em Brasília e bateu uma saudade danada dela. Mas não era saudade de conversar com ela, porque fazíamos isso quase todos os dias. Era saudade de ouvi-la cantando uma das músicas que ela ensinava às crianças. "Joguei meu anel no mar" e "Garibaldi foi cedinho à missa, galopando um cavalo sem espora...". Aí, era noite de plantão e eu liguei. Conversamos e ela inacreditavelmente cantou as músicas ao telefone. E eu me lembro, como se fosse hoje, que quando desliguei, falei pras pessoas que estavam perto de mim que quando tivesse um bebê, minha irmã iria ensiná-lo a cantar como ela, porque se dependesse de mim... eles só saberiam falar (muito).
Só que Deus não permitiu que fosse assim. Ele quis que tudo fosse diferente. E nós, como filhos, entendedores de que a vontade dEle é boa, perfeita e agradável, que tudo coopera para o bem daqueles que O amam, que não cai uma folha de uma árvore sem que Ele permita, que para tudo debaixo do céu há um propósito e que os planos dEle são insondáveis, vivemos. Sofremos, choramos, rimos com as lembranças, nos emocionamos com as fotos. 
Neste momento que estou vivendo, com a gravidez despontando, descobrindo uma novidade a cada dia, sentindo o bebê mexer, tendo medo do que pode acontecer daqui a vinte anos, na semana que vem ou daqui a dois minutos, escolhendo roupas, ganhando presentes, imaginando o rosto da Aurora, pensando em como vai ser cada banho, ou pentear os cabelos.... e realizando uma vontade minha, muito recente, confesso, que foi o único e maior sonho dela, infelizmente não realizado, Neste momento, a saudade aumenta, eu penso nela em cada novidade. Em cada frio na barriga, em cada mexidinha, em cada notícia boa.
E vai ser assim. Sempre.

segunda-feira, junho 29, 2015

Aí, Deus faz


É Deus quem age, sempre. Tudo foi criado por Ele, para Ele e é tudo dEle. A minha vida, inclusive. De uma forma que, a cada dia, mais me surpreende.
Os meus três leitores já devem ter sabido, pelo Facebook ou pelo Instagram, que a novidade da minha vida para os próximos anos aconteceu no fim de semana. No sábado, eu fiz um exame de sangue e o resultado foi positivo. É, agora é fato. Estou grávida.
Vínhamos tentando há um ano e agora, no tempo de Deus – que pra nós é “finalmente” -, aconteceu.
É claro que a ficha não caiu ainda. Talvez demore algum tempo, talvez não. O fato é que não caiu. Ainda não entendo perfeitamente o que significa isso. Não o fato de estar grávida, mas o fato de que a partir de agora, tudo vai mudar.
O fim de semana foi de surpresas. Até o Devan soube da novidade de um jeito diferente. Consegui pregar uma peça e a reação dele, ao receber uma roupinha de bebê, como se fosse qualquer coisa de que ele precisasse, foi surpreendente. Com os meus pais, a mesma coisa, só que com um uma caixa de sabonete da linha “VÔ VÓ”. Eles custaram a entender o que era, mas quando perceberam... foi uma alegria só, com muita gritaria e lágrimas à vontade.
O Facebook e o Instagram me ajudaram um pouco nessa “divulgação” da notícia. Sei que ainda é muito cedo – estamos de cinco semanas – mas eu precisava compartilhar com as pessoas que estiveram perto da minha família nos últimos anos.
Pra minha família, tudo ainda é muito novo. Só a dor da perda é antiga. E a notícia de um bebê nos alegra, nos une ainda mais e, mais do que isso, renova em nós a esperança de restituição.
Bom seria mesmo se, em vez de falar em dor ou em saudade ou em perda, eu pudesse contar que, além do Devan e da minha mãe, minha querida irmã Mônica também ficou sabendo da nossa benção com uma surpresa. E ela se alegraria, afinal de contas, nada nessa vida a completava mais que gravidezes, crianças, filhos – dos outros – e tudo o que tem a ver com este universo.
 Só que Deus quis que fosse diferente.
E nós não O questionamos por isso. Em vez de perguntas, amor e confiança. Gratidão, principalmente, por ter Ele, nos permitido tê-la por tantos anos, por ter Ele nos emprestado um ser tão especial. E por nos dar, neste momento, uma nova esperança de alegria, como vem fazendo neste quase dezenove meses de ausência.

Então, a Deus, só muito obrigada por este bebê que está começando a crescer e vai mudar a minha vida, e muito obrigada também por todo o resto. Tudo, sem exceção.

quarta-feira, junho 08, 2011

Os cálculos e eu

Sei que este assunto é polêmico, mas não resisti a ele, diante de tantos problemas encontrados nos livros de matemática distribuídos pelo MEC para crianças de todo o país.

Na verdade, criei coragem pra mencionar o assunto aqui porque, se até estudiosos e autores de livros de matemática e consultores do Ministério da Educação têm dúvidas na hora de fazer pequenos cálculos, por que eu não poderia ter?
Pois eu tive, sim. Aliás, se for olhar pra algumas contas de subtrair, ainda hoje eu teria problemas, mas com aquele sistema de “prova real” – que fui praticamente obrigada a aprender, tendo em vista minha dificuldade nas tais continhas de menos – e o advento da calculadora... fica difícil ter problemas.
E essa dificuldade tem razão de ser. E eu explico – disso eu entendo.
Ingressei na pré-escola com 3 anos de idade. É, meus pais até tentaram me fazer ‘cursar’ as sérias normais para a minha idade e me matricularam no jardim de infância (maternal, primeiro período... qualquer que seja o nome dado a esta fase), mas eu não me adaptei e, de tanto pedir para estudar com ‘lápis e papel’, fui colocada numa turma do pré-escolar em caráter experimental (se eu não me adaptasse...).
Até hoje, escolas públicas só aceitam crianças na pré-escola com 6 anos de idade. Isso porque, se ela passou por todas as etapas do processo de escolarização, 6 anos é a idade exata em que vai ingressar no pré. Como eu tinha uns meses menos que isso, fui levada a uma escola particular.
Ótimo. Eu me adaptei e cursei naquele colégio o pré, a primeira e a segunda séries. A partir da terceira serie, estudei em escola pública.
Os meus três leitores podem estar se perguntando o que é que isso pode ter a ver com os eventuais problemas que tive com as contas de subtrair. Calma, vai dar pra entender.
Todo mundo sabe que escolas públicas e privadas seguem métodos de ensino diferenciados. E aí é que mora o perigo.
Na particular, aprendi a fazer as continhas de subtrair de um jeito na segunda série. Na pública, na terceira série, de outro. Isso na teoria, claro, porque na prática, deu uma confusão e eu acabei não aprendendo de nenhum jeito.
Pra nenhuma outra pessoa no mundo, uma conta “armada”, de 52 menos 49 pode ser tão confusa quanto foi pra mim durante boa parte da minha infância e adolescência. Sei que existem duas formas de fazer essa subtração, mas quem disse que a minha cabeça aprendeu a separar uma da outra? É, é exatamente isso. Na conta armada, com unidade sob unidade, dezena sob dezena e tal, eu preciso tirar 9 de 2, certo? A resposta pode ser simples: pede emprestado. Toda criança de 7 anos de idade pede emprestado e resolve a conta. Para aquelas que estudam em escola particular, o empréstimo é feito pra um número da dezena. Pras de escola pública, pra outro. Numa dessas empreitadas aí, uma criança precisa devolver o que pegou emprestado e a outra não.
Resultado? Na hora de fazer a conta, eu pego emprestado com um, devolvo pro outro – isso quando devolvo – ou pego emprestado com o outro e devolvo sem precisar... uma loucura sem tamanho.
E este problema me perseguiu por muito tempo. Confesso que até hoje ele me persegue, mas hoje eu carrego uma calculadora na carteira, tenho uma na cabeceira da minha cama, uma na gaveta da minha mesa no trabalho e a do laptop, pra quando não estou em casa. E se estiver sem nenhuma dessas possibilidades ao meu alcance, apelo para a prova real. É, aquele sistema de conferência que a gente também aprende na escola, que, numa conta de subtrair, é só somar a segunda parcela (subtraendo) com o resultado da conta (resto ou diferença) pra obter a primeira parcela (minuendo), lembra? Pelo menos eu me lembro dos nomes dos números... e da prova real também.
Ela sempre me ajuda. Confesso também que muitas vezes eu preciso dar uma rasurada no resultado da conta de menos, porque percebo, com a prova real, que devolvi pra quem não precisava ou maloquei alguma dezena sem devolver.

quinta-feira, outubro 29, 2009

Erros

Por que a gente erra assim? Hoje eu me peguei pensando nisso logo cedo, ao me levantar.
E nem foi um erro meu que me fez pensar nisso, foram erros de outras pessoas.
Eu conheci alguém que me disse várias vezes que não existe o certo o errado. Eu nunca concordei e continuo não concordando. O fato é que tudo depende do ângulo de observação e, de certa forma, essa pessoa pessoa tinha razão. O que é errado pra uns não é pra outros. Cada um toma para si o que acha certo ou errado. Toda a atitude que tomamos na vida tem seus prós e seus contras. Cabe a cada um definir disposição para consequências. Boas ou más.
Erramos sem querer, muitas vezes. Erramos conscientes, em outras.
Erramos por ignorância, por vaidade, por teimosia, por orgulho.
Erramos por acreditar que aquilo é o certo a se fazer.
Erramos por não querer pedir conselhos a alguém que os pode dar. Sim, sempre há alguém mais experiente que nós, com vivência suficiente para nos colocar um pouco de razão. Ou de emoção. Ou de medo. Lembro-me de ter aprendido em Brasília que o medo é a nossa segurança. Enquanto eu tivesse medo, estaria segura. Pode ser. Aliás, provavelmente é.
Quando há medo, há menos erros. Porque há razão. Porque há menos emoção. Porque há pé no chão. Talvez medo seja fundamental para menos erros.
Erros nos castigam. Erros nos entristecem. Erros nos ensinam.
Sim, erros nos fazem perder. Perder amigos, perder oportunidades. Perder amores. Perder tempo, perder cabelo, perder fôlego. Perder vida.
Erros nos fazem não aproveitar os momentos, as pessoas, a beleza de cada sorriso. Erros nos fazem meter os pés pelas mãos. Erros nos fazem solitários.
O erro nos deixa preocupados. O erro deixa rastro. Deixa mágoa. E melancolia, muitas vezes.
Os erros não deveriam existir. Ou as pessoas que erram porque querem não deveriam existir? É, porque há quem erra porque quer. Estou certa disso.
Eu sofro é por essas, que erram por bobagem. Perdem por bobagem. Entristecem por bobagem.
São essas que mais precisam de nós.

sábado, novembro 08, 2008

Tudo errado...

Eu já tive a sensação de que fiz errado. Ou de que, por algum motivo - desconhecido ou não - eu vá fazer. E, pior, já tive a sensação de estar fazendo. Sem gerundismos... literalmente. Estar fazendo. No presente.
E é assim que eu to me sentindo hoje. Por vários motivos. Uns deles conhecidos e até evitáveis. Outros não. Não tive escolha. Precisei...

quinta-feira, agosto 28, 2008

Como sorrir no retrato de família*

*Livia Garcia-Roza

Se você foi convocada a comparecer à casa de seus pais para tirar uma fotografia – como preparação para as Bodas deles – junto aos quase quarenta membros da família, não se atormente nem se aborreça. Para alguns, estar entre familiares é uma alegrai; para outros, desesperante. Se você pertence ao segundo grupo, seguem algumas linhas:
Pise firme ao entrar no olho do furacão, evitando assim tropeços logo de saída; em seguida abra a bolsa e retire um chiclete, a goma tem função importante nesses momentos, ela ocupa as mandíbulas e é capaz de sustentar uma mastigação raivosa, além do refrigério que produz ao invadir sua boca. Cumprimente os parentes oferecendo as bochechas; palavras são desnecessárias, balance apenas a cabeça e, quando muito, repita chavões. É suficiente. Nesse trajeto vai se escoar um bom tempo. Após os cumprimentos, um respiro: escape para o banheiro. Cuidado apenas com os gestos, lembre-se de que o espaço é pequeno. Aproveite a solidão do lavabo e se veja no espelho. A cara está péssima. Retoque o batom e nem mais uma mirada. Na volta, cruze a sala, alheia ao bando que a rodeia. E uma vez sentada, ausente-se; e observe à distância a rebeldia dos laços humanos. Atenção, no entanto, às falas apontadas para você, as armas são muitas e surgem inesperadamente; ao ser perguntada por que está sem trabalho, ou ao ouvir comentários sobre a atual mulher do seu ex, mostre-se vaga. E não se deixe perturbar por cutucadas, risos e falas sussurradas. Mantenha a calma e a goma de mascar. Serenus. A seguir, imagine-se dentro de um avião, ao lado do seu namorado, com destino a um balneário paradisíaco. Pense em vocês dois correndo nas límpidas areias da praia em direção às pequenas ondas azuis. As desencontradas vozes presentes, as exclamações e os decibéis infantis facilitarão a decolagem rumo ao paraíso. E o fotógrafo que se posta diante do grupo do qual do qual você já se levantou vôo transforma-se na aeromoça que, cheia de gestos, detalha seu método infalível de como se salvar de um abrupto acidente aéreo.
De repente, uma agitação maior. E não foi do susto pela onda que se elevou na praia imaginada. Sua mãe acaba de saltar do sofá e sair às pressas. Alguém diz tratar-se de uma corrida ao banheiro. Os adultos riem, as crianças aproveitam para correr, os bebês, engatinhando, disparam pelo chão da sala. O fotógrafo volta a ceder vez à aeromoça que, baixando a máscara, a devolve para a poltrona da frente. E seu sonho voa. As pessoas circulam ao redor da mesa à procura do que comer. Sua avó, cabeça tombada, cochila em meio ao tumulto. De repente, a porta da cozinha se abre e o cachorro entra em cena e, depois de uma volta completa na sala, desaparece. Passada meia hora de barulheira insana, sua mãe retorna em passos rápidos, penteando as sobrancelhas com os dedos. O fotógrafo volta a empunhar a máquina, e todos retornam aos assentos, a se espremer e a sorrir. E você, passageira, também sorri, ao perceber que dentro de instantes família não há nem nada; e o flash espoca.

domingo, agosto 10, 2008

Série Primeiros Passos*

*Beatriz Bracher

Primeiro passo para:
  • passar de ano, escrever uma tese, conseguir emprego, casar-se, separar-se, pintar o cabelo, ter filhos, matar-se, cuidar do jardim, lavar a roupa suja, comprar uma tesourinha de unhas nova...

- desejar passar de ano, escrever uma tese, conseguir emprego, casar-se, separar-se, pintar o cabelo, ter filhos, matar-se, cuidar do jardim, lavar a roupa suja, comprar uma tesourinha de unhas nova...

  • tornar-se um herói

- criar um inimigo coletivo e falível

  • tornar-se vítima

- adicionar poder e alcance ao seu inimigo

  • tornar-se mártir

- acrescentar violência ao adversário e cutucá-lo com vara curta

  • adaptar-se a uma nova cidade de uma maneira torta

- ironizar as diferenças da nova morada em relação à antiga

  • adaptar-se a uma nova cidade de forma estrangeira

- achar fofas, graciosas, divertidas, imensamente típicas as diferenças da nova morada em relação à antiga

  • adaptar-se a uma nova cidade de forma tão necessariamente feliz nem triste, mas irremediável

- queimar os navios

  • viver

- nascer

  • morrer

- nascer

  • sobreviver

- conseguir algum afeto por si, fora de si, que se sustente mesmo quando o seu próprio afeto por si e pelo outro desaparecer

  • deixar de fazer o planejado (dieta, estudo, trabalho etc)

- dizer, ou pensar, 'eu mereço'

  • dar o primeiro passo

- não sei, e, de qualquer maneira, conseguir dar o primeiro passo não é nenhuma garantia de que você será capaz de dar o segundo.

quinta-feira, julho 10, 2008

As Sete Grandes Vantagens da Depressão Crônica *
(ou manual do spleen para deprimidos amadores)

* Marcelo Moutinho

Não obstante servir como alvo permanente da condenação dos profetas do otimismo fácil, a depressão representa um importante elemento motopropulsor da criação artística. É sabido que a melancolia constituiu traço inequívoco da personalidade de alguns dos mais célebres nomes do meio cultural e artístico - escritores, dramaturgos, cineastas, pintores e escultores que, seguindo caminho contrário ao apregoado pela filosofia nouveau riche da auto-ajuda e apostando no spleen, conquistaram lugar e fama no olimpo do sucesso, seja durante a vida, seja post mortem. Mas se parece fácil conquistar espaço cativo nesse disputadíssimo mercado, desfrutar de seus privilégios é prerrogativa de poucos. Somente aqueles que atentam para os benefícios associados a um verdadeiro estado depressivo crônico conseguem usufruir, efetivamente, de tais regalias.
Chega de ouvir as pessoas dizendo para você desentocar, sair de casa, ir ver um filme, andar de bicicleta, fazer um curso, olhar para o céu, constatar que o sol pode iluminar a usa vida Reaja! Defenda seu direito à angústia profunda, ao baixo-astral, ao pessimismo, lembrando e reafirmando dia após dia ("é só por hoje") as sete grandes vatagens da depressão crônica:

1. Capacidade de mobilização - Quando você é um depressivo crônico, forma-se uma verdadeira e extensa rede de afetividade à sua volta. Parentes, amigos, colegas de trabalho, todos se mostram 24 horas por dia preocupados com a sua saúde e seu estado de ânimo, estimulando programas em grupo e emprestando generosidade as suas companhias. Em suma: você nunca será um indivíduo solitário.

2. Personalidade de referência - Em oposto ao que se imagina, o indivíduo dominado pelo spleen goza de extrema popularidade. Ele é invariavelmente lembrado, mesmo em conversas alheias - e em geral acarretando apaziguação. É muito comum que amigos, diante de situações-limite, recorram ao nome do depressivo para tranqüilizar seus interlocutores: "Calma, que eu não sou Fulano", "Está pensando que vou ficar que nem Sicrano?".

3. Manutenção da boa forma - Um legítimo deprimido costuma carregar a tiracolo sinais claros de anorexia. A baixa ingestão de calorias resulta em economia nas despesas mensais, entrava os riscos da obesidade e garante um corpo magro, preceito tão importante na atual sociedade.

4. Garantia de atenuantes -Em razão de estar habitualmente às voltas com remédios repletos de efeitos colaterais, o depressivo goza de atenuantes exclusivos de seu estado e que o distinguem do restante da população. Diante de uma gafe, de uma atitude reprovável, de uma frase mais grosseira, ou mesmo de um equívoco ou uma falta no trabalho, ele sempre tem na manga uma ótima justificativa: "É que hoje não tomei minha fluoxetina", "Ontem acabou a risperidona"...

5. Ar de conteúdo - Você não consegue imaginar um depressivo crônico saltitando em meio a uma micareta, certo? isto porque o deprimido mantém, como marca inata, uma aura de conteúdo, um ar de quem leu todos os livros, viu todos os filmes, peças, exposições, e dedica todo o seu tempo à admirável missão de meditar sobre os sentidos da existência.

6. Estilo cool - A recorrência das cores pretas no vestuário assegura um estilo cool que nunca sai de moda. Pelo contrário: ao reafirmar seu tipo clássico diante das novas tendências, o depressivo conquista uma imagem de autonomia e bom gosto. A fidelidade aos cortes sóbrios e tons escuros tem a vantagem adicional de evitar constrangimentos, como o de deparar, muitos anos depois, com sua imagem coberta de trajes ridículos em velhas fotografias.

7. Distância dos chatos - Vendedores de coisas inúteis e sua forma mais contemporânea - os atendentes de telemarketing - mantêm-se afastados dos depressivos crônicos. Convencer um indivíduo essencialmente melancólico a comprar ou associar-se a determinado serviço é tarefa árdua. Basta ao sujeito em depressão festejar o chamado recebido - "Que bom que você ligou, estou precisando tanto conversar..." - e eles desistem imediatamente.

Percebeu? Não é qualquer um que pode gozar de tantos benefícios. E se ainda assim for vítima de alguma recaída e de repente começar a sentir que no fundo do poço existe uma mola, a acreditar que o mundo pode de fato se transformar num imenso e delicioso Prozac, recorde-se dop princípio elementar da depressão: você não é especial. A exemplo de outros milhares de habitantes do planeta, é apenas mais um pobre-diabo condenado à morte desde o nascedouro. Mas pelo menos tem noção disso.

*Publicado originalmente em "35 Segredos para chegar a lugar nenhum"

Como chegar a lugar nenhum

Essa semana, numa das minhas visitas diárias à livraria, eis que me oferecem um lançamento da Bertrand Brasil. "35 segredos para chegar a lugar nenhum". O título pode causar estranheza aos meus três leitores que, possivelmente, conhecem a minha posição quanto à obras de auto-ajuda, e é aqui que entra a parte mais curiosa da 'obra'.
'35 segredos' é considerado "Literatura de Baixo Ajuda". Organizado por Ivana Arruda Leite, traz textos de 35 autores diferentes, sobre temas do dia-a-dia, mas com abordagem cômica. Sempre com humor.
Antes de me decidir por adquirir o livro, eu o folheei. E, pasmem, acreditei no que tinha me dito o Anderson ("Na hora que eu vi, lembrei de você... dá pra publicar umas coisas legais no brog", ele me disse): no livro tem altas dicas pra eu colocar aqui!
E farei isso!!!!
Vou começar a série de posts com o próximo: "As sete grandes vantagens da depressão crônica".